Entenda por que Sheikh Jarrah está no centro da crise em Jerusalém
O pavio da violência está reaceso em Jerusalém e, ao que parece, pode levar algum tempo para se apagar. Em seu coração, está um pequeno bairro palestino chamado Sheikh Jarrah –quase esquecido nestes últimos dias, entre as notícias de embates e bombardeios aéreos.
A história não é nova. Há anos, na verdade, essa vizinhança em Jerusalém Oriental opõe palestinos e israelenses. Em 2014, quando eu era correspondente da Folha no Oriente Médio, eu escrevi uma reportagem sobre as tensões entre os moradores daquele bairro.
As casas de Sheikh Jarrah foram construídas em 1956 pelo governo Jordaniano –que naquela época controlava a parte leste de Jerusalém– para abrigar famílias de refugiados palestinos. Eles tinham sido forçados a deixar as suas casas após a criação do Estado de Israel, em 1948. Depois da subsequente tomada de Jerusalém Oriental por Israel, em 1967, colonos israelenses começaram a se mudar para o bairro.
Em parte, os colonos se baseavam na história da comunidade judaica que morava ali na Antiguidade, perto da tumba de Simeão, um sumo sacerdote de em torno de 300 a.C. Eles se baseavam também na suposta compra de terrenos no século 19, contestada por palestinos. A lei israelense permite que israelenses retomem as propriedades que eles deixaram em 1948. Palestinos, porém, não podem fazer o mesmo.
Após uma série de disputas legais, Israel começou a despejar famílias palestinas de Sheikh Jarrah, no que palestinos chamam de limpeza étnica. A última vez foi em 2009, com a expulsão das famílias Hanoun e Ghawi. Mas a tensão seguiu. Em 2014, quando escrevi minha reportagem, a família Kurd tinha que dividir sua casa com colonos judeus que tinham se instalado ali, sob a vista das autoridades.
A retomada recente de ações de despejo voltou a inflamar os ânimos. Há ações em curso para expulsar diversas famílias. Houve protestos de palestinos contra essas medidas, seguidos de embates com as autoridades israelenses. Sheikh Jarrah se tornou, assim, um símbolo de uma questão maior –em especial, o uso de leis que se aplicam apenas a parte da população e a frequente expulsão de palestinos de suas casas.
Foi nesse contexto que os últimos eventos se desenrolaram. Entre eles, a violência na mesquita de al-Aqsa, a terceira mais sagrada para o islã. Forças de segurança israelenses dispararam balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo dentro da mesquita, que estava lotada de fiéis neste período festivo de ramadã, o mês sagrado para os muçulmanos. Segundo o Centro Palestino para os Direitos Humanos, 305 palestinos foram feridos no local nesta segunda-feira (10).
Agravando a situação, a facção radical Hamas lançou foguetes contra Jerusalém. O grupo, considerado terrorista por Israel e pelos Estados Unidos, vinha ameaçando Israel devido ao que estava acontecendo em Sheikh Jarrah e na mesquita de al-Aqsa. Em revide, o Exército israelense bombardeou a faixa de Gaza. Segundo o Hamas, nove pessoas morreram durante os ataques aéreos, incluindo três crianças.