Rede social Clubhouse serve de válvula de escape no Oriente Médio
Na manhã desta quinta-feira (11), usuários da rede social Clubhouse conversavam em árabe sobre o que bem entendiam. Em uma sala bastante popular, por exemplo, médicos respondiam a perguntas sobre a vacina contra a Covid-19. Em outra, cinéfilos fofocavam sobre os bastidores da telona. Também havia um grupo de pessoas analisando os sonhos umas das outras. E uma sala com o título “o que você vai fazer neste final de semana”, para jogar conversa fora mesmo. Esses são exemplos pontuais da explosão de diálogo acontecendo — por enquanto no subterrâneo — nessa recém-nascida rede social.
O Clubhouse é um aplicativo de conversas em áudio, em geral entre desconhecidos. Você seleciona uma sala, entra e começa a ouvir, quiçá também falar, sobre o assunto que escolher. Pode parecer trivial, em sociedades com liberdade de expressão e poucos tabus. Em partes do Oriente Médio, no entanto, essa rede social tem servido de válvula de escape. Na conservadora e repressiva Arábia Saudita, o Clubhouse chegou ao topo da lista de aplicativos sociais da loja da Apple. No Egito, há salas com mais de 2.000 participantes. Na Turquia, onde se fala turco, ativistas usaram essa rede em como ferramenta de protesto.
Segundo uma reportagem recente do Washington Post, a diáspora síria — espalhada pelo mundo devido à guerra civil que assola o país desde 2011 — tem usado o Clubhouse para reviver suas tradicionais conversas matutinas. Nessa rede social, eles contam piadas, pedem dicas de onde comprar comida levantina nos seus novos países e falam também sobre como o regime sírio devastou partes do país nestes últimos anos.
Um dos grandes poréns do Clubhouse, por ora, é o fato de que o aplicativo só funciona no sistema iOS, excluindo quem não tem dinheiro para comprar um iPhone — em partes do Oriente Médio, a imensa maioria da população. Como lembra o Post, a acessibilidade é afetada também pelos cortes diários de eletricidade e internet.
Há um problema ainda maior, no entanto. A conversa sem filtro, por vezes de tom político, parece já incomodar os governos autoritários da região. Usuários reclamam do funcionamento do aplicativo nos Emirados Árabes, por exemplo. A imprensa egípcia já acusa o Clubhouse de apoio a células terroristas, típica acusação feita a quem discorda do regime. Um artigo no site Middle East Eye insiste em que a pergunta não é “se” as ditaduras vão começar a monitorar essas conversas, mas “quando”. Esses governos se lembram, afinal, do papel que redes como o Facebook e o Twitter tiveram em mobilizar os protestos de 2011, que derrubaram regimes autoritários na região.