Após explosão de Beirute, centenário do Grande Líbano é marcado por pessimismo
Esta terça-feira (1º) marca o centenário da proclamação do Estado do Grande Líbano, o antecessor histórico da atual República Libanesa. Parte da população, no entanto, enxerga poucas razões para celebrar a data. Esse aniversário, afinal, chega menos de um mês depois da explosão de 4 de agosto no porto de Beirute, que deixou 180 mortos, 6.000 feridos e devastou uma parte extensa da cidade mediterrânea.
Para muitos, a explosão no porto é mais uma das consequências da maneira com que o Estado foi criado em 1º de setembro de 1920. O Império Otomano havia sido derrotado na Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918) e, como consequência, seu território foi desmembrado e distribuído entre potências europeias. A França tomou o controle do que são hoje a Síria e o Líbano. O Grande Líbano, criado em 1920, virou a República Libanesa em 1926. O Líbano declarou a sua independência em 1943 e as tropas francesas finalmente recuaram dali em 1946.
Com um impressionante material histórico, a Reuters destrinchou essa história no vídeo abaixo. O áudio e as legendas estão apenas em inglês.
The deadly Beirut port blast on August 4 this year set the tone for a subdued 100-year anniversary for the state of Lebanon https://t.co/7GRpTzVQ0Z pic.twitter.com/9eafgG3o4J
— Reuters (@Reuters) August 27, 2020
Uma das principais críticas a como o Líbano foi criado nos anos 1920 é o fato de que o país foi recortado dentro do que era até então a região da Grande Síria. Havia precedentes históricos — o Monte Líbano, por exemplo, tinha alguma autonomia nas últimas décadas do Império Otomano. Mas as fronteiras foram traçadas pela França de modo a satisfazer suas próprias ambições coloniais, tentando fazer com que o Líbano fosse um enclave cristão no Oriente Médio. Assim, parte da população cristã celebrou a declaração do Grande Líbano em 1920, enquanto muçulmanos ressentiram ter sido separados do que se tornaram a Síria e a Palestina. “As pessoas foram dormir um dia pensando que eram sírios ou otomanos e acordaram no dia seguinte e se viram em um Estado libanês”, afirmou à Reuters Salah Tizani.
O Líbano foi organizado, em seguida, em um sistema político confessional. Isso significa que cada grupo religioso ganhou direitos políticos específicos. Por exemplo, o presidente é sempre um cristão maronita, enquanto o premiê é muçulmano sunita e o líder do Parlamento é muçulmano xiita. Essa separação levou a frequentes embates no país, abrindo espaço para a guerra civil travada de 1975 a 1990, que deixou cerca de 150 mil mortos e 17 mil desaparecidos.
O Estado criado em 1920 foi cimentado de maneira a permitir a corrupção de sua liderança política e o sectarismo. Segundo as avaliações preliminares, o descaso das autoridades está relacionado a como nitrato de amônio foi armazenado de maneira perigosa no porto de Beirute — resultando na explosão em agosto.
“Você vive entre uma guerra e outra, e você reconstrói e então tudo é destruído e você reconstrói mais uma vez”, disse à agência Reuters o diretor de teatro Nidal al-Achkar. “É por isso que perdi a esperança.”