Curitiba ainda tem uma estátua do ex-ditador sírio Hafez al-Assad
No contexto de um movimento global de protestos, manifestantes têm derrubado estátuas de figuras históricas. Americanos desabaram líderes confederados de seus pedestais, por exemplo, enquanto ingleses jogaram um mercador de escravos em um rio e portugueses vandalizaram o jesuíta Antonio Vieira. O bandeirante Borba Gato, em São Paulo, teve de ser vigiado 24 horas por dia para não cair também. Essas ações abriram um debate sobre como lidar com a memória.
Uma estátua em Curitiba, no entanto, tem passado batida por essa onda de derrubadas: a do ex-ditador sírio Hafez al-Assad. Como lembrou Jean-Philip Struck na rede social Twitter na semana passada, o busto de Hafez segue incólume em uma pracinha da cidade. Disse:
Sobre a discussão das estátuas. Em uma praça de Curitiba existe um busto do antigo ditador sírio Hafez al-Assad, pai do igualmente sanguinário Bashar al-Assad. Foi instalado no início dos anos 2000. Continua no mesmo local, nove anos após o início da guerra civil pic.twitter.com/zwEZTT2VO4
— Jean-Philip Struck (@jeanstruck) June 13, 2020
Hafez al-Assad governou a Síria de 1970 a 2000. Foi ele quem cimentou o violento estado de polícia que sobrevive até hoje. Ele é responsável, também, pela chacina de 1982 em Hama — durante a qual a cidade foi devastada, e seus moradores, massacrados. A Síria, governada por seu filho Bashar, vive desde 2011 uma guerra civil.
O busto de Hafez al-Assad, no bairro Portão, foi posto em 2002 por um projeto do então vereador Paulo Salamuni, um descendente de árabes. Uma placa apresenta Hafez como “o grande construtor da Síria moderna”. Em 2012, houve protestos contra a estátua, por razão da violência sistemática do estado sírio contra a própria população.
O Brasil abriga uma das principais comunidades sírias do mundo. Foi para o Brasil que sírios e libaneses migraram em massa entre 1870 e 1930, fugindo do Império Otomano e do mandato francês. Entre outras coisas, eles trouxeram o quibe e a esfiha e levaram de volta para a terra natal o chá mate que aprenderam a beber na América Latina.
A estátua de Hafez não é, aliás, a única relação incômoda entre políticos sírios e o Brasil. Adib al-Shishakli, que foi presidente da Síria nos anos 1950, fugiu para Goiás depois de ser deposto. Em 1964, ele foi assassinado em Ceres por um migrante sírio em busca de vingança.