5 anos depois, sobreviventes relembram massacre de 817 pessoas no Egito

Vocês, Orientalíssimos leitores, talvez já tenham se esquecido — há 5 anos, em 14 de agosto de 2013, centenas de pessoas foram mortas na mesquita de Rabaa al-Adawiya no Cairo. O massacre marcou a história recente do Oriente Médio e empurrou o Egito a um período de repressão que ainda segue vigente, mas por enquanto não recebe a mesma atenção dada para os atentados a Madri, Londres e Paris.

O episódio foi considerado pela organização Human Rights Watch como um dos mais extensos extermínios de manifestantes em um único dia. Aquela entidade afirma que houve ao menos 817 mortos. O governo estima o saldo em 638 pessoas, entre elas 43 policiais.

A data, no entanto, não passou batida nas redes sociais daquela região, que compartilharam relatos e fotografias. O tuíte abaixo, por exemplo, diz: “Um dia sombrio caso você se considere humano. Depois do massacre, entrei em discussões asquerosas com pessoas que acreditavam ser OK matar mil pessoas em algumas horas. Tive as mesmas discussões depois dos ataques de 11 de Setembro nos EUA”.

O massacre de 14 de agosto ocorreu semanas depois de o Exército egípcio derrubar o então presidente islamita Mohamed Mursi, eleito um ano antes nas primeiras eleições livres do país. Os simpatizantes do mandatário se reuniram na mesquita de Rabaa al-Adawiya, no Cairo, em uma vigília pacífica. As forças de segurança se mobilizaram para desalojar a multidão — centenas de pessoas foram mortas ali, no que o governo descreve como embates, e os sobreviventes, como extermínio.

Estive em Rabaa al-Adawiya antes e depois do massacre, acompanhado pelo fotógrafo Joel Silva, e talvez alguns de vocês ainda se lembrem das reportagens que publicamos na Folha. Em outra mesquita, onde os corpos foram velados, embrulhados em panos brancos, os familiares tentavam ocultar o cheiro dos cadáveres espirrando perfumes florais.

São histórias duras, como aquelas relembradas pela testemunha Mahmoud Bondok em um relato publicado no ano passado pelo Middle East Eye. “Franco-atiradores e forças de segurança apareceram no telhado de uma construção militar do outro lado da rua e começaram a disparar. Nesse momento nossas emoções foram paralisadas e nossos instinto de sobrevivência foi ativado. As pessoas corriam de maneira frenética enquanto o gás lacrimogênio caía sobre nós. Foi um caos.”

Há mais informações sobre aquele dia. A rede árabe Al Jazeera, por exemplo, publicou uma reportagem nesta quarta-feira (14) sobre os pedidos internacionais por investigações. A organização humanitária Anistia Internacional, por sua vez, criticou a impunidade vigente. Em uma mensagem recente na rede social Twitter, um dos diretores da Human Rights Watch resumiu o efeito do massacre nos últimos anos: “Rabaa al-Adawiya continua a lançar sombras escuras sobre o Egito”.