No século 19, os EUA tentaram criar um exército de camelos

Em meados do século 19, quando as autoridades americanas investiam na integração de seu extenso e inóspito território, decidiram importar uma solução típica de um distante Oriente Médio: o transporte nas corcovas dos camelos. A ideia era defendida por Jefferson Davis, secretário de Guerra dos EUA de 1853 a 1857. O major Henry Wayne argumentava, à época, que os animais incrementariam o poderio americano com sua velocidade e resiliência, possivelmente formando uma cavalaria. “Os americanos poderão lidar com os camelos ainda melhor do que os árabes”, Wayne disse, e o projeto seria “um legado ao futuro, como a introdução dos cavalos pelos primeiros colonos”.

Camelos foram utilizados por diversos outros povos durante os últimos séculos. O historiador Heródoto relata, por exemplo, que os camelos persas desorientavam as cavalarias gregas com seu forte cheiro característico. Romanos empregaram esses animais no norte da África, e Napoleão usou a tática quando invadiu o Egito no século 18. A Itália arregimentava forças montadas a camelo nos anos 1930 na Somália. Mas o curioso projeto americano é raramente lembrado.

Camelos na campanha italiana na Somália nos anos 1930. Crédito Giovanni Valle

Essa história foi recuperada nesta segunda-feira (4) pelo jornal New York Times, no aniversário de 163 anos da primeira expedição para importar camelos do Oriente Médio. O navio USS Supply zarpou ao que são hoje a Turquia e o Egito. A equipe, chefiada por Wayne, comprou 33 animais, incluindo um “booghdee” —cruzamento entre camelo e dromedário. Ao chegarem ao Texas, eles integraram o Corpo de Exército de Camelos. Em paralelo, foi criada uma Companhia de Transporte por Camelo para carregamentos entre Texas, Califórnia e Panamá. O trecho ficou conhecido como a “Rota do Dromedário”.

Segundo uma outra reportagem do New York Times,

Os camelos provaram seu valor como animais de carga. Esses “navios do deserto” podiam carregar até 130 quilos e viajar com poucas paradas. Levavam sal, produtos e o correio entre Tucson e Los Angeles. Não só pareciam ser mais econômicos do que cavalos ou mulas, mas davam também a impressão de serem mais independentes: comiam arbustos típicos do Texas, dos quais os outros animais não se aproximavam.

Mas o experimento, a princípio bem avaliado pelos generais americanos, foi interrompido em 1861 quando na Guerra Civil seu principal entusiasta, Davis, passou ao bando dos confederados pró-escravidão. A maior parte dos animais foi vendida e, com o tempo, fugiu à natureza. Os camelos selvagens ainda foram avistados por décadas, perambulando entre os desertos americanos.

O último exemplar da trupe original morreu em 1934 dentro de um zoológico. Na mesma data, foi erguido um monumento em homenagem ao domador Hadji Ali. Também conhecido como Hi Jolly, ele era um cidadão otomano de origem síria que havia sido recrutado pelos EUA para o Corpo de Exército de Camelos. Hadji Ali é relembrado hoje no Arizona por uma pirâmide –e a estátua de um camelo.

Monumento ao sírio Hi Jolly, no Arizona. Creative Commons/Marine 69-71