Arquivo on-line reúne 858 horas de vídeos sobre a revolução egípcia de 2011

As imagens de milhões de pessoas convergindo à praça Tahrir, no Cairo, marcaram o ano de 2011 e se tornaram um dos símbolos da chamada Primavera Árabe. Foi aquela multidão que forçou o então ditador Hosni Mubarak a renunciar após quase 30 anos de mando, inspirando manifestações no restante do Oriente Médio.

Mas os vídeos daqueles dias históricos, que celebraram em janeiro seu aniversário de sete anos, estão desaparecendo aos poucos. Ativistas relatam que diversas das imagens foram excluídas de redes sociais — o professor Amro Ali, da Universidade Americana do Cairo, sugeriu em 2017 que simpatizantes do governo haviam reclamado ao YouTube. “Deletar um vídeo é um ataque a nossa memória coletiva”, ele escreveu.

Preocupados com o sumiço dessas imagens, um grupo de ativistas lançou no mês passado um banco de dados de 858 horas de vídeos de protestos de 2011 a 2013. São mais de 35 dias de arquivos registrando abusos policiais, greves e os entornos dos necrotérios após a morte de manifestantes, segundo a notícia do site Al-Monitor.

O projeto 858 foi realizado pelo coletivo Mosireen reunindo imagens próprias e contribuições. Segundo a descrição na página do projeto:

Nos primeiros dias dos protestos uma tenda de mídia foi estabelecida na praça Tahrir. Centenas de vídeos foram coletados de dezenas de pessoas –homens e mulheres, jovens e velhos– que haviam documentado eventos-chave e que queriam contribuir à memória digital daquele momento. […] Filmamos e coletamos imagens em todo o Egito. Nós não somos observadores neutros, e sim atores dentro de uma luta mais ampla. Participamos e documentamos ao mesmo tempo. Estamos engajados em uma batalha de narrativas, de uma revolução contra uma contra-revolução do Exército.

Os protestos da praça Tahrir levaram à eleição do islamita Mohamed Mursi em 2012, no primeiro pleito livre da história do Egito. Mas, em 2013, um golpe removeu aquele governo e levou o militar Abdel Fattah al-Sisi à presidência — ele concorre à reeleição em março sem oposição real. A repressão nos últimos anos ecoa a das décadas de Mubarak, com prisioneiros políticos, bloqueios à internet e a remoção de menções aos protestos de 2011 nos livros didáticos, segundo o site Al-Monitor.

Pichação na praça Tahrir, durante os protestos de 2011. Crédito Dylan Martinez/Reuters

No navegador do arquivo 858, é possível filtrar os vídeos de acordo com assunto, lugar, data e palavra-chave. As imagens estão em árabe e não têm legendas, mas o site em si tem também explicações em inglês. Os organizadores dizem, na página: “Este é evidentemente apenas um arquivo da revolução. Não é, e nunca poderá ser, o único arquivo. É uma coleção de memórias, um conjunto de ferramentas que nós podemos utilizar para continuar a construir histórias para o futuro”.