Preciso ser sunita ou xiita? Não posso ser um sushi?
Assisti hoje ao trailer do documentário “Why Can’t I Be A Sushi” (por que eu não posso ser um sushi, em inglês). A produção, que estreou no Reino Unido, discute as divisões sectárias dentro do islã a partir da perspectiva de duas jovens irmãs de origem iraquiana, uma sunita e a outra xiita. Elas preferem ser “sushi” do que aderir a disputas ideológicas.
O termo “sushi”, que mistura “sunita” e “xiita”, fez algum sucesso em 2014, quando uma fotografia circulou pelas redes sociais retratando uma família segurando mensagens em folhas de papel: a mãe dizia “sou sunita”, o pai afirmava “sou xiita” e a filhota concluía “sou sushi”. Mais tarde, relatos sugeriam que a imagem fosse uma montagem –mas a mensagem já havia cativado uma audiência cansada dos confrontos, por vezes violentos, entre ambas as interpretações do islã.
Essa questão é tema do documentário “Why Can’t I Be a Sushi”, de Hoda Elsoudani. A rede de TV Al Jazeera conversou com ela sobre a produção. Segundo a diretora:
Estive pensando por muitos anos em fazer um filme sobre o conflito entre sunitas e xiitas. Eu mesma sou um “sushi”, no sentido de que eu pego o melhor de ambos os ramos. Eu sentia que as pessoas sempre estavam tentando me empurrar para pertencer a um grupo ou ao outro, e primeira questão era sempre se eu era sunita ou xiita. Quando você responde “sou apenas muçulmano”, não era o suficiente. Isso realmente me incomodava.
Em “Why Can’t I Be a Sushi”, as duas irmãs conversam com outros muçulmanos sobre as tensões sectárias. Elas entrevistam clérigos, por exemplo, e transeuntes. Perguntam quais são as diferenças entre sunitas e xiitas, e por que afinal uma pessoa não pode ser ambos.
À plateia, a pergunta pode parecer ingênua. Conflitos políticos levaram, nas últimas décadas, à deterioração das relações entre sunitas e xiitas. Em países com o Iraque, as disputas tomaram a forma de um conflito religioso que remete a disputas históricas entre muçulmanos. Para a organização terrorista Estado Islâmico, por exemplo, xiitas são infiéis e devem ser perseguidos por sua crença.
A contradição entre a visão das duas irmãs e a seriedade da questão é proposital, afirma a diretora à Al Jazeera. Pois:
Eu queria lembrar as pessoas da simplicidade do islã. Sentia que, se eu abordasse essa questão tão complexa e sensível de maneira tão simples, pelos olhos de duas crianças inocentes apesar de maduras, teria um grande impacto no modo de pensar. Isso nos faz refletir sobre nossas ações, comportamentos e padrões de pensamento mais do que se o documentário fosse apresentado por adultos.