Beirutíssimo
Na noite de terça-feira (12), deitado na cama e com um livro em mãos, fui surpreendido por um som agudo vindo da rua. Uma mulher ululava: ulululululululululululululai! Mais do que o visto no meu passaporte, a ululação — demonstração de alegria que no mundo árabe é chamada de “zaghruta” — foi para mim uma espécie boas-vindas.
Pousei nesta semana em Beirute para um período de dois meses, durante os quais vou continuar contribuindo para a Folha e para este Orientalíssimo projeto. Ademais, levarei adiante minha pesquisa de mestrado, que está relacionada à região. Achei portanto de bom tom anunciar aqui esta pequena transição, em que haverá algo de “beirutíssimo” neste blog.
Conheço pouco o Líbano. Estive algumas vezes no país, a passeio e a trabalho, mas sempre por períodos curtos. Visitei Beirute, Trípoli, Biblos e vilarejos no sul, sem porém conviver diariamente com seus habitantes. Por outro lado, de alguma maneira o Líbano me é familiar. É o país de diversos de meus professores na USP, como Safa Jubran (tradutora do libanês “Porta do Sol”). É também o país dos 7 milhões de descendentes de libaneses que moram hoje no Brasil, incluindo o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. Não por acaso cresci comendo tabule e quibe cru na casa de minha avó, apesar de ter nascido em uma família italiana. A cultura libanesa é parte da nossa história.
Estar em Beirute tem inclusive o estranho efeito de me trazer memórias da infância. Por exemplo, da volta às aulas, quando uma amiga descendente de libaneses voltava de suas férias no Líbano e nos trazia o estranho “chiclete com sabor de sabão”, que hoje entendo ser de anis. Ou de quando essa mesma colega me ensinava o que seriam minhas primeiras palavras em árabe, apesar de eu só recentemente ter me lembrado dessas lições (ainda tenho o caderninho onde escrevi “ana budek uered”, uma tentativa de dizer “eu quero um”).
O Líbano do presente, porém, me surpreende não pela goma de mascar inusitada, mas por sua diversidade cultural. Espero que, nos dois próximos meses, eu consiga dividir parte dela com os leitores deste blog. Como este vídeo que encontrei hoje por acaso na página de Facebook de um amigo. É uma interessante campanha em prol dos direitos homossexuais no país — um forte contraste em relação ao Egito, em que gays têm sido detidos. “Se você não reconhece a existência deles, isso não quer dizer que eles não existam”, diz o vídeo, que infelizmente ainda não tem legendas.
Para quem mais estiver interessado neste país, aproveito para compartilhar abaixo o vídeo de uma das minhas canções libanesas prediletas, cantada pela diva local Fayruz. Também recomendo o perfil do Live Love Beirut no Instagram, onde usuários publicam suas imagens preferidas da cidade. Sugestões para futuros posts serão, aliás, bem-vindas por e-mail.