Na ponta da língua –mas qual?

Diogo Bercito
Alunos palestinos estudam hebraico na Universidade Islâmica na Cidade de Gaza. Crédito Adel Hana/Associated Press

Israel é uma terra de mitos. Mitos fundadores, mitos religiosos, mitos políticos. Algumas das ideias construídas ao redor dessa região são motivo de conflitos históricos.

Há os mitos mais inocentes, também. Como aquele de que, aqui, todo o mundo fala inglês e, portanto, é desnecessário aprender a falar a língua hebraica.

– Slicha, aval ani lo medaber ivrit – Tento explicar, sorridente, à funcionária do banco em que abri minha conta. Desculpa, mas não falo hebraico. Ela continua a falar comigo nessa língua semítica.

– Eifo ata gar? – Ela me pergunta. Eu entendo que quer saber onde moro, mas não sei responder. Volto ao “ani lo medaber ivrit”, e ela me ignora.

– Ve at medaber anglit? – Sondo. Fala inglês? Nada. A essa altura, já não estou mais sorridente.

De alguma maneira, finalizamos meu cadastro. Ela me entrega uma pilha de papéis para eu assinar –em hebraico. Folheio para tentar pescar alguma informação. Opa, olha meu nome ali. Só que…

– Slicha… Aval shemi lo Diogo Brasileiro… – Desculpa, mas meu nome não é Diogo Brasileiro, digo. Ela aponta para meu passaporte, orgulhosa, como quem diz que anotou tudo direitinho.

Ponho a cabeça entre as mãos e suspiro. Irritada, a funcionária chama alguém que fala um pouco de inglês. Explico que não vou assinar nada que não consiga ler. Começa uma discussão acalorada, orientalíssima.

No fim, saio do banco com os papéis assinados. Ligo a um amigo e peço que veja os documentos, durante um almoço de fish & chips no mercadão, e me diga se fiz bobagem. Parece que não.

A bobagem é demorar tanto para aprender o hebraico. Não só para a vida cotidiana –mas também para o trabalho. Nenhum entrevistado é obrigado a falar inglês, e a cada entrevista que perco é uma história a menos para contar.

Começo, hoje, meu curso de hebraico. Por isso o post –estou animado, queria dividir. Espero que me entendam. Aposto até que muitos de vocês já falam a língua. Quem sabe não me ajudam, no percurso?

Comentários

  1. hebraico não é facil. eu estudei por uns dez anos da minha vida e depois em alguns cursos aqui e acolá. alem de ser de lá pra cá e ter outros caracteres, ainda estudei na escola com os tais pontinhos – que sao as vogais. sem elas, que é o que rola em cada milimetro de espaço em Israel – onde fui duas vezes e quero voltar muitas, o negócio é deduzir o que está escrito. nao abandone seu inglês nunca. existem lugares turísticos, como o bar da entrada principal do mar morto, que falam um espanholzinho.

    sorte aí, Diogo Bercito!

  2. Em Israel visitei uma Sinagoga Sefardita e pensei…vou falar um pouco de “Espanhol”! Ao avistar a primeira pessoa perguntei: Atah Medaber Sfaradit? Lo…Ani Medaber Rusit rsrs

  3. Não falam mesmo! Estive lá em 2008 e foi uma dificuldade na comunicação com áreas periféricas de. Nos pontos turisticos o espanhol rola muito bem. O iidiche é falado por eles também, que parece uma variação do hebraico. é um país lindo e facil de entrar mas, dificil de sair. Me perguntaram uma 2o vezes se as minhas malas não tinha sido trocadas, se tive proposta de trazer alguma coisa. Enfim…um saco. Chorei demais em alguns lugares santos e quase morri de tanto chorar no museu do holocausto.

  4. Ate suas vivências pessoais como a relatada hoje servem de aula para todos os que como eu, pouco ou nada sabem sobre esse lado do mundo tão discutido, mas pouco conhecido. Obrigada por mais essa oportunidade de estudar e viajar através de seu blog. Te desejo 3 Ss saúde, sorte e sucesso.

  5. Diogo, estou morando em Israel há 10 meses, não pude estudar muito no início porque cheguei aqui grávida e logo tive meu bebê, e tive que adiar os estudos, mas há um mês recomecei a Ulpan, que me fez aprender muito mais neste mês do que nos outros meses em que não estudei. O que percebo é que todos que falam inglês aqui demoram muito mais tempo para aprender o hebraico, porque sempre recorrem ao inglês, até se depararem com uma situação como a sua, em que o inglês não funcionou. (Por coincidência, no meu banco tbém não falam inglês…) e o conselho que te dou é que tente ao máximo se comunicar em hebraico. E ao estudar verá que não é tão difícil qto parece de início. Boa sorte!

  6. A propósito, me ocorreu algo bem engraçado outro dia: tocaram o interfone e era uma mulher falando em hebraico. Entendi que ela pediu para eu abrir a porta e disse a palavra “mishtará”. o resto não entendi. Meu pensamento foi que não havia feito nenhuma compra ou pedido, tampoco esperava alguém, então não abri a porta. Meu marido chegou logo depois e cruzou com a mulher, que era da polícia (mishtará) e queria entrar para averiguar o apartamento ao lado… Rimos muito! Ao menos não esqueço mais como se diz “polícia” em hebraico…

  7. Cheguei aqui em Israel há 5 anos e no início achei que nunca ia conseguir falar essa língua em que nenhuma palavra parece com as palavras nas outras línguas que falo. Depois de 1 ano, só ouvindo as pessoas falarem, sem ir ao “ulpan”, comecei a entender o que as pessoas falavam, mas não conseguia falar na mesma proporção e morria de vergonha de falar errado. Depois de 2 anos, já falando a língua, finalmente fui ao ulpan para melhorar a leitura e a escrita e hoje, depois de 5 anos, falo sem problema algum, entendo tudo, faço piada e as pessoas já não perguntam mais de onde sou, pois têm certeza de que sou israelense. Ainda não consigo ler um livro ou escrever um longo e-mail em hebraico, pois como não preciso escrever ou ler em hebraico todo dia, esqueço como escrever muitas das palavras. Agora estou procurando mais um desafio: comecei a estudar persa 😀
    Boa sorte nos estudos! Hebraico é uma língua simples (gramaticalmente falando e se comparado às línguas latinas). Você chega lá!

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