Lenda do boxe, Muhammad Ali era um herói entre muçulmanos americanos
O boxeador americano Muhammad Ali, 74, morreu aos 74 anos neste final de semana devido a problemas respiratórios. Ele era lembrado no mundo do esporte por seus movimentos ágeis e pelos reflexos rápidos, que “faziam com que raramente fosse atingido com força”, segundo o obituário publicado pelo repórter Eduardo Ohata na Folha.
Entre muçulmanos americanos, porém, Muhammad Ali era celebrado como um de seus heróis. Nascido Cassius Clay, ele converteu-se ao islã nos anos 1960 e adotou um novo nome, celebrando tanto o profeta do islã (Maomé, ou Muhammad em árabe) quanto um de seus califas mais conhecidos, Ali. A combinação entre ambos os nomes é bastante comum no Oriente Médio.
O “Daily Beast” publicou neste sábado (6) uma reportagem sobre a morte de Muhammad Ali, afirmando que sua ausência será lamentada especialmente entre a comunidade muçulmana nos EUA, da qual era era o “primeiro herói muçulmano”. “Ele era uma fonte de orgulho para muitos muçulmanos americanos”, escreve Dean Obeidallah.
Muhammad Ali fez parte de diversos ramos do islã, como o movimento nacionalista negro Nação do Islã, o sunismo e –a partir de 2005– a vertente mística do sufismo. Ele era visto como inspiração não apenas a muçulmanos americanos, segundo Obeidallah, mas a outros crentes ao redor do mundo.
Para Margari Aziza, que co-fundou uma entidade anti-racismo, Muhammad Ali representava uma forte mensagem a respeito de ser negro e muçulmano nos EUA, e o boxeador ajudou americanos a acostumar-se ao nome “Muhammad”. “Fez com que a vida de crianças nos EUA cujos pais lhes deram o nome de Muhammad fosse mais fácil.”
O próprio Muhammad Ali fala sobre sua religião neste vídeo abaixo. “Rios, lagos e córregos. Todos eles têm nomes diferentes, mas todos eles contêm água. As religiões também têm diferentes nomes, mas todas elas contêm Deus e a verdade”, diz o esportista.
A imprensa de países árabes destacou a morte de Muhammad Ali durante o final de semana. O correspondente da rede Al Jazeera Rob Reynolds, por exemplo, afirmou que “coisas como sua conversão ao islã e sua oposição à Guerra do Vietnã fizeram dele mais que um atleta e uma estrela dos esportes. Fizeram dele uma figura cultural”.
Quando recentemente o candidato presidencial Donald Trump propôs a proibição à entrada de muçulmanos nos EUA, Muhammad Ali emitiu um comunicado oficial dizendo que o político não deveria manejar o islã como uma ferramenta de campanha.
“Nós, muçulmanos, temos que nos levantar contra aqueles que usam o islã em prol de sua própria agenda. Eles alienaram muitos de aprenderem sobre o islã. Muçulmanos de verdade sabem, ou deveriam saber, que forçar o islã a outras pessoas é contra nossa religião.”
Como lembra este texto, Donald Trump questionou em dezembro passado o presidente americano Barack Obama, que havia elogiado esportistas muçulmanos nos Estados Unidos. “De que esporte ele está falando?”
Obama said in his speech that Muslims are our sports heroes. What sport is he talking about, and who? Is Obama profiling?
— Donald J. Trump (@realDonaldTrump) 7 de dezembro de 2015
O que é razoavelmente irônico, já que Trump citou no passado Muhammad Ali como um exemplo de coragem. Em 2013, o candidato republicano escreveu em sua conta oficial no Twitter que “quem não é corajoso o suficiente para assumir riscos não vai conseguir nada na vida”.
“He who is not courageous enough to take risks will accomplish nothing in life.” – Muhammad Ali — Donald J. Trump (@realDonaldTrump) 16 de julho de 2013
A quem se interessar mais sobre a relação de Muhammad Ali com o islã, o jornal britânico “Telegraph” publicou um artigo nessa linha. “Onde tendemos a ver a conversão de ocidentais ao islã como totalmente motivada pela política, ou como uma reação intelectual a acontecimentos, o que é impressionante na fé de Ali é o quão pessoal, calma e profunda ela obviamente era”, escreve Tim Stanley.