Orientalíssimo https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br por Diogo Bercito Tue, 30 Nov 2021 20:49:20 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Quatro romances árabes fundamentais para ler durante a quarentena https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2020/03/22/quatro-romances-arabes-fundamentais-para-ler-durante-a-quarentena/ https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2020/03/22/quatro-romances-arabes-fundamentais-para-ler-durante-a-quarentena/#respond Sun, 22 Mar 2020 13:43:48 +0000 https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/files/2020/03/Saadawi.jpg https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/?p=5254 Têm circulado pelas redes sociais listas de livros para ler durante a quarentena. Todos estamos — ou deveríamos estar — isolados em casa. Minha colega Marina Dias, correspondente da Folha em Washington, me desafiou no sábado (21) a publicar as minhas recomendações no Twitter. Quando escrevi a lista, me dei conta de que todas as minhas sugestões estavam relacionadas ao mundo árabe.

Resolvi, então, estender as recomendações aqui neste Orientalíssimo blog também. Os quatro livros que estão na lista abaixo são fundamentais para quem se interessa pelo Oriente Médios. São clássicos que, se você estuda a região, precisa ler ou ao menos conhecer. Caso alguém precise de mais sugestões de leitura, fiquem à vontade para me escrever um e-mail — estamos juntos nesta crise.

Tempo para Migrar Para o Norte (Tayeb Salih)
Escrito pelo sudanês Tayeb Salih, este é provavelmente um dos romances árabes mais importantes do século 20. É também uma das primeiras obras pós-coloniais em árabe, lidando com o impacto do colonialismo britânico no norte da África. A história se passa em um vilarejo sudanês à beira do rio Nilo nos anos 1950, com o retorno de um morador local que passou algum tempo estudando em Londres. A tradução ao português foi feita pela professora da USP Safa Jubran.

Entre Dois Palácios (Naguib Mahfouz)
O escritor egípcio Naguib Mahfouz foi o único árabe até hoje a receber o Nobel de literatura. Entre Dois Palácios é o primeiro livro de sua trilogia épica. Para quem gosta dos romances da Jane Austen, esta é uma espécie de versão egípcia. Em vez do interior da Inglaterra, o cenário é o centro do Cairo. O autor acompanha uma mesma família durante as tumultosas primeiras décadas do século 20, enquanto os personagens envelhecem, casam, morrem e assistem a revoluções.

Gold Dust (Ibrahim al-Koni)
O líbio Ibrahim Al-Koni conta, neste romance, a história de um jovem e seu camelo no norte da África. Li este livro há pouco tempo. Infelizmente, não há tradução ao português, mas vale o esforço a quem lê em inglês — o texto me tocou profundamente. O autor não é árabe, e sim tuareg, então incluo ele aqui com essa ressalva. No entanto, o texto foi escrito em árabe. O livro deve interessar a quem tem curiosidade para conhecer melhor a cultura berbere tuareg no norte da África.

Woman at Point Zero (Nawal El Saadawi)
Este livro, escrito pela egípcia Nawal El Saadawi, é um dos clássicos do feminismo em língua árabe. Saadawi conta a história de uma médica que, visitando um presídio, conhece uma prisioneira acusada de assassinato. Aos poucos, o leitor entende qual exatamente foi o crime cometido por ela. No texto, El Saadawi discute temas como o patriarcado e a solidariedade entre mulheres. Para quem quiser conhecer melhor a autora, publiquei em 2016 uma entrevista com ela.

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Em meio a protestos, regime do Sudão decide desligar a internet https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2019/06/13/em-meio-a-protestos-regime-do-sudao-decide-desligar-a-internet/ https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2019/06/13/em-meio-a-protestos-regime-do-sudao-decide-desligar-a-internet/#respond Thu, 13 Jun 2019 16:06:52 +0000 https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/files/2019/06/Sudao-e1560441673392-320x213.jpg https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/?p=4711 O Sudão está completamente no escuro. Entre protestos e denúncias de violações dos direitos humanos, o regime militar decidiu apertar o interruptor e derrubou a internet no país. O blecaute, segundo o Comitê para a Proteção dos Jornalistas, é quase completo — o que significa que o país de 40 milhões de pessoas agora está offline.

O regime, que governa o país em caráter temporário desde a deposição do ditador Omar al-Bashir em abril passado, já vinha sufocando a rede desde 3 de junho. O escurecimento da internet coincide com ataques violentos a manifestantes no país. Mas, na segunda-feira (10), as autoridades derrubaram praticamente todas a comunicação.

A estratégia, segundo ativistas sudaneses, serve para vários fins. Por exemplo, dificulta a comunicação entre grupos de oposição, que já não podem contar com serviços como Whatsapp para se organizar. São obrigados a conversar por telefone ou se reunir pessoalmente, o que aumenta o risco de repressão. Ademais, sem internet, ativistas não conseguem divulgar as violações aos direitos humanos — por exemplo, o uso de força para dispersar manifestações. Um porta-voz das autoridades de transição explicou as medidas recentes, afirmando que a internet “representa uma ameaça à segurança nacional”.

Blecautes na internet não são uma novidade, como escreveu Steven Feldstein no jornal Washington Post. Mas a tática tem se tornado cada vez mais comum entre regimes autocráticos, como maneira de controlar seus cidadãos. As autoridades locais recorrem a essa estratégia, em especial, quando elas são desafiadas nas ruas.

Derrubar a internet, no entanto, é bastante custoso, diz Feldstein. Como todo o mundo fica offline, os negócios são impactados também. Cinco dias de blecaute no Sudão significam, segundo o jornal americano, uma perda de US$ 228 milhões (quase R$ 900 milhões). Ironicamente, os protestos começaram devido às agruras econômicas, incluindo o alto preço do pão. Empobrecer o país de pouco ajuda.

Dito isso, o cálculo que o governo sudanês talvez tenha feito é que pouca gente de fato usa a internet por ali. Apenas 31% usam a rede, diz Feldstein, e só 7% usam as redes sociais. Ademais, a porcentagem que usa essas redes coincide com a população que está nas ruas, protestando. O regime decidiu, pois, que valia a pena apagar a luz.

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Por atritos políticos, árabes celebram ramadã em diferentes datas https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2019/06/04/por-atritos-politicos-arabes-celebram-ramada-em-diferentes-datas/ https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2019/06/04/por-atritos-politicos-arabes-celebram-ramada-em-diferentes-datas/#respond Tue, 04 Jun 2019 15:41:06 +0000 https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/files/2019/06/akurat_20190524015633_1deU9Y-e1559662390354-320x213.jpg https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/?p=4697 O calendário do ramadã, o mês sagrado para os muçulmanos, envolve todo os anos uma certa pitada de política. O período de jejum — se você não se lembra do que é o ramadã, releia este guia que escrevi há alguns anos — termina em uma suntuosa celebração conhecida como Eid al-Fitr. Mas a data é variável, pois depende da aparição da lua nova nos céus. Cada país decide quando está na hora de comemorar, uma decisão que frequentemente segue os seus alinhamentos políticos.

Apesar de a política estar sempre presente, ela parece vir em dose extra neste ano, como sugere um texto da agência de notícias Associated Press. A Arábia Saudita celebra o festival já nesta terça-feira (4), ao lado de Kuait, Qatar e Emirados Árabes Unidos. Do outro lado do espectro, Egito, Síria, Jordânia e Palestina anunciaram que vão esperar até a quarta-feira (5), por não terem visto a lua nova em seus territórios. No passado, jordanianos e palestinos seguiram o calendário saudita, algo com que parecem ter rompido agora, causando certo desconforto.

Segundo a agência de notícias, o Eid al-Fitr já tinha sido anunciado na faixa de Gaza, mas foi adiado após as autoridades religiosas em Jerusalém decidirem outra data. A notícia foi recebida com algum protesto no território palestino — afinal, além do significado religioso, o fim do ramadã também significa romper o jejum de um mês.

A situação é ainda mais delicada no Sudão, dividido politicamente desde a derrocada do ditador Omar al-Bashir em abril passado. O regime militar de transição anunciou que o Eid al-Fitr começa na quarta-feira, mas os manifestantes disseram que vão celebrar na terça.

Algo semelhante aconteceu no Iêmen, um país em guerra civil após a onda de protestos de 2011. O governo reconhecido internacionalmente vai comemorar na terça-feira. Os rebeldes xiitas da facção Huthi, no entanto, vão esperar até o dia seguinte. A Associated Press diz que é a primeira vez na história moderna do país em que o Eid é dividido.

Essa situação se repete no restante da região. Sunitas e xiitas — ramos do islã — celebram em datas diferentes no Líbano e no Iraque, por exemplo. Na rede social Twitter, o analista Haizam Amirah-Fernández resumiu o cenário na mensagem abaixo, em espanhol. O fim do ramadã não depende da lua nova, ele escreveu, e sim da política.

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O que ler sobre o Sudão depois da deposição do ditador Omar al-Bashir? https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2019/04/11/o-que-ler-sobre-o-sudao-depois-da-removida-de-seu-ditador-bashir/ https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2019/04/11/o-que-ler-sobre-o-sudao-depois-da-removida-de-seu-ditador-bashir/#respond Thu, 11 Apr 2019 13:30:56 +0000 https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/files/2019/04/Bashir-e1554989068318-320x213.jpg https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/?p=4583 Após quatro meses de protestos, o Exército do Sudão anunciou nesta quinta-feira (11) a deposição e a detenção do ditador Omar al-Bashir, que governava desde um golpe em 1989. O Sudão, um país africano de língua árabe localizado ao sul do Egito, será governado por uma junta militar durante os próximos dois anos. No meio-tempo, para quem quiser conhecer mais sobre aquela nação, faço abaixo duas sugestões distintas de leitura. Uma é de literatura e a outra é de antropologia.

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LITERATURA: TEMPO DE MIGRAR PARA O NORTE

Este livro, publicado pelo sudanês Tayeb Salih em 1966, é um dos romances mais importantes já escritos em árabe. Trata-se da história de Mustafa Said, um migrante sudanês radicado em Londres, e de seu retorno a um diminuto vilarejo à beira do Nilo. Salih encaixa essa narrativa dentro do contexto mais amplo do colonialismo britânico no Sudão e das visões negativas dos europeus em relação ao país. A obra foi traduzida ao português pela professora da USP Safa Jubran.

ANTROPOLOGIA: FOR THE LOVE OF THE PROPHET

Esta segunda recomendação deve interessar mais a quem já tem experiência com o mundo acadêmico. Em “For the Love of the Prophet” (pelo amor do profeta), Noah Salomon investiga o Estado islâmico criado no Sudão e de que maneira o governo e a população interagiram com interpretações específicas da religião. Essa obra é especialmente instigante pela maneira com que o autor analisa não apenas os discursos oficiais, mas também o dia a dia dos sudaneses e como eles vivem sua religião de modo particular — por exemplo, ouvindo transmissões de rádio ou participando de confrarias místicas.

Celebrações nas ruas do Sudão após a queda do ditador Omar al-Bashir. Crédito Reuters
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