Orientalíssimo https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br por Diogo Bercito Tue, 30 Nov 2021 20:49:20 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Eleição de Biden é recebida com cautela e humor no Oriente Médio https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2020/11/09/eleicao-de-biden-e-recebida-com-cautela-e-humor-no-oriente-medio/ https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2020/11/09/eleicao-de-biden-e-recebida-com-cautela-e-humor-no-oriente-medio/#respond Mon, 09 Nov 2020 15:13:37 +0000 https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/files/2020/11/PHOTO-2020-11-09-10-08-50-320x213.jpg https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/?p=5862 Enquanto os Estados Unidos contavam os votos de sua eleição, circulava nas redes do Oriente Médio uma série de variações de um mesmo meme. Imagens de homens entediados vinham acompanhadas de uma legenda mais ou menos nesta linha: “árabes esperam para saber quem vai vencer e ser o próximo a invadir o Oriente Médio”.

Também se espalharam inúmeras imagens com o termo árabe “inshallah”, dito pelo democrata Joe Biden durante um debate com o republicano Donald Trump. Em árabe, “inshallah” significa “se Deus quiser”. É de onde vem o termo em português “oxalá”. Com isso, usuários das redes sociais fizeram a troça de que Biden venceu as eleições de terça-feira (3) porque falou a palavra quase mágica.

Esses dois memes simbolizam, de certa maneira, a mistura de cautela e humor entre quem acompanhou o pleito americano no Oriente Médio. Cautela porque, afinal, ninguém espera que o presidente eleito Biden vá mudar a região de maneira radical. Ele deve manter a embaixada americana em Jerusalém, por exemplo, e continuar a reconhecer a presença israelense nas colinas do Golã – duas medidas de Trump que causaram revolta. No máximo, a eleição de Biden serviu de incentivo aos movimentos que pedem a saída do premiê israelense Binyamin Netanyahu. O tuíte abaixo diz: “Agora que ele se foi, é a sua vez”.

Já o humor com que as pessoas receberam a eleição de Biden vem do fato de que poucos entre as populações na região consideravam Trump um aliado. Árabes e iranianos vivendo nos Estados Unidos e seus descendentes, muito menos. Trump foi o responsável por um veto à entrada de cidadãos de diversos países de maioria muçulmana, por exemplo, afetando quem vinha de lugares como a Síria, o Iêmen e o Irã. Biden prometeu que vai reverter essa medida no seu primeiro dia de governo. Trump insistia nos debates em que tal decisão iria permitir que terroristas entrassem no país “para explodir nossas cidades”.

Além de reverter o veto à entrada de muçulmanos, Biden deve se afastar de Trump em outras políticas em relação ao Oriente Médio. Como este Orientalíssimo blog mostrou antes das eleições, a expectativa é de que o presidente eleito se afaste de regimes autoritários como o da Arábia Saudita e o do Egito. Ele também deve tomar uma posição mais dura em relação ao governo turco — analistas disseram à Al Jazeera, por exemplo, que Trump era o único aliado que restava à Turquia em Washington, a capital americana.

Ainda é cedo, é claro, para saber se o resultado da eleição de Biden será positivo, negativo ou mesmo neutro para o Oriente Médio. O que sabemos é que, no ínterim, as populações da região seguem atentas ao que acontece nos Estados Unidos. A charge no tuíte abaixo resume essa situação, ao mostrar passageiros de um táxi no Irã discutindo quais estados americanos iriam determinar o resultado deste pleito.

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Biden e Trump têm visões distintas para o futuro do Oriente Médio https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2020/10/26/biden-e-trump-tem-visoes-distintas-para-o-futuro-do-oriente-medio/ https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2020/10/26/biden-e-trump-tem-visoes-distintas-para-o-futuro-do-oriente-medio/#respond Mon, 26 Oct 2020 20:20:17 +0000 https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/files/2020/10/Sisi-320x213.jpg https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/?p=5834 Os Estados Unidos votam no próximo dia 3 em uma das eleições mais importantes de sua história recente. A pandemia do coronavírus, que já matou mais de 225 mil pessoas no país, é um dos temas centrais do panorama eleitoral, acompanhado pela questão de como reconstruir uma economia em frangalhos. Com isso, sobrou pouco tempo para os candidatos falarem em política externa. Nos debates entre o republicano Donald Trump e o democrata Joe Biden, mal se falou no tema. O silêncio não quer dizer, no entanto, que o tema seja irrelevante. Trump e Biden representam visões distintas sobre que papel os Estados Unidos devem desempenhar no exterior. No que diz respeito ao Oriente Médio, por exemplo, a eleição de um ou de outro pode impactar as políticas americanas em relação a Israel e ao Irã.

Um dos principais pontos de desacordo entre Trump e Biden é a relação dos Estados Unidos com regimes autoritários na região. Trump tem boas relações com líderes acusados de reprimir suas populações. Ele já se referiu ao egípcio Abdel Fattah al-Sisi como seu “ditador favorito”. O republicano é próximo também da monarquia da Arábia Saudita, apesar do assassinato do jornalista dissidente saudita Jamal Khashoggi, algo que motivou uma intensa crítica internacional.

Biden, por outro lado, tem uma postura mais dura. O democrata, é claro, não vai romper laços com importantes parceiros na região como o Egito e a Arábia Saudita caso seja eleito. Mas, segundo algumas análises, ele deve ao menos cobrar que esses regimes cessem suas violações aos direitos humanos em troca, por exemplo, de oportunidades comerciais. No caso saudita, isso pode significar restrições na venda de armas, algo menos provável sob Trump. Biden deve tentar, também, retirar o apoio à guerra saudita no Iêmen.

Em outras áreas, porém, uma eventual vitória de Biden dificilmente vai fazer com que os Estados Unidos mudem sua posição de maneira drástica. Um relatório recente do Eurasia Group sugere, nesse sentido, que o governo americano terá tantas questões domésticas para resolver em 2021 que terá pouco tempo para o Oriente Médio.

O conflito árabe-israelense é um bom exemplo. Trump fomentou um plano de paz que escanteou os palestinos e exacerbou a impressão de que os Estados Unidos não são um mediador isento. O republicano também tomou a decisão de mover a embaixada americana de Tel Aviv para Jerusalém — emulada pelo Brasil de Jair Bolsonaro — e promoveu o reconhecimento da presença israelense nos territórios disputados das colinas de Golã. Essas duas medidas romperam com o consenso internacional e com o precedente dos próprios Estados Unidos. Além disso, Trump tem dado bastante atenção ao Oriente Médio, patrocinando acordos entre Israel e os Emirados Árabes, o Bahrein e o Sudão. Na prática, está isolando ainda mais os palestinos.

Não existe a expectativa de que, se eleito, Biden vá reverter o curso dessas políticas. O democrata, por exemplo, já elogiou publicamente os acordos entre Israel e os Emirados. Será difícil, também, voltar atrás na localização da embaixada ou da soberania nas colinas. Ainda assim, segundo algumas análises, Biden deve tentar reposicionar os Estados Unidos como um mediador neutro. Talvez isso signifique retomar alguns dos programas de auxílio aos palestinos encerrados por Trump. Ele também deverá ter uma relação menos calorosa com o líder israelense Binyamin Netanyahu, a quem Trump tanto elogia.

Um outro tema no qual Biden não difere tanto de Trump é na relação entre os Estados Unidos e o Irã. Se vencer o pleito, o democrata não deve correr para se reaproximar de Teerã. Ele tampouco deve remover de imediato as sanções econômicas impostas por Trump. O que talvez Biden faça diferente, se morar na Casa Branca, é tentar trazer o Irã à mesa de negociação, em vez de se afastar por completo. A ideia é condicionar as relações com Teerã ao cumprimento das restrições a seu programa nuclear. Como mostra um texto da Bloomberg, essa possibilidade já preocupa Israel e países do Golfo. Uma outra reportagem sugere que o Irã pode começar a exportar até 2 milhões de barris de petróleo por dia se Biden vencer o pleito — outro sinal do impacto que o voto do dia 3 nos Estados Unidos pode ter no mundo.

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O Oriente Médio não é um ‘lugar complexo’ de ‘conflitos milenares’ https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2020/01/07/o-oriente-medio-nao-e-um-lugar-complexo-de-conflitos-milenares/ https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2020/01/07/o-oriente-medio-nao-e-um-lugar-complexo-de-conflitos-milenares/#respond Tue, 07 Jan 2020 13:50:44 +0000 https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/files/2020/01/Sykes-320x213.jpg https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/?p=5054 Desde a morte do general iraniano Qassim Suleimani na madrugada de sexta-feira (3), voltou a circular pela imprensa e pelas redes sociais a ideia de que o Oriente Médio é um lugar pavorosamente complicado. Outra ideia que tem bastante força é a de que os conflitos naquela região são milenares — e, portanto, são impossíveis de solucionar. Este Orientalíssimo blog, no entanto, discorda dessas duas avaliações, que mais servem para impedir o engajamento crítico com a situação.

Essa suposta complexidade excepcional do Oriente Médio é um dos estereótipos que ajudam a tornar a região ainda mais distante, exótica e inexplicável. Sobra a um punhado de analistas e políticos a tarefa de explicar, afinal, o que está acontecendo por ali. A política iraniana não é mais difícil de entender do que a brasileira ou a americana, no entanto, para quem se esforça em estudá-la e em falar a sua língua.

Outro estereótipo recorrente é o da antiguidade dos confrontos no Oriente Médio. Como quem diz que não adianta tentar resolver os problemas da região, porque eles existem há tanto tempo que já se naturalizaram. Mas não há nada de ancestral em tantas dessas crises. O sistema político sectário do Líbano, por exemplo, não remonta aos primórdios do mundo — e sim ao colonialismo francês do século 20.

Em seu livro “Orientalismo”, o pensador palestino Edward Said criticou justamente essa ideia de que o Oriente Médio é uma região imutável. A tese de que os árabes e o islã estão fadados a nunca mudar serviu, no passado, para justificar missões civilizatórias e a colonização da região.

Para quem está interessado em conhecer melhor o assunto e evitar generalizações, segue abaixo uma lista sugerindo cinco boas obras.

“Orientalismo”, Edward Said
“Contending Visions of the Middle East”, Zachary Lockman
“Uma História dos Povos Árabes”, Albert Hourani
“The Arabs: A History”, Eugene Rogan
“Maomé”, Karen Armstrong

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Em meio a crises, iranianos encontram algum alívio no humor https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2019/05/28/em-meio-a-crises-iranianos-encontram-algum-alivio-no-humor/ https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/2019/05/28/em-meio-a-crises-iranianos-encontram-algum-alivio-no-humor/#respond Tue, 28 May 2019 13:01:21 +0000 https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/files/2019/05/TrumpAlo-320x213.jpg https://orientalissimo.blogfolha.uol.com.br/?p=4671 Entre as sufocantes sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos e as ameaças de guerra, Donald Trump recentemente sugeriu uma solução para a crise entre seu país e o Irã. A repórteres ele disse que espera um telefonema dos iranianos para resolver o impasse.

A ideia de que os iranianos pudessem telefonar para o presidente americano foi recebida com escárnio no Irã. O pesquisador Reza Akbari mencionou, em um texto no site Al-Monitor, a série de mensagens publicadas na rede social Twitter com a etiqueta “Alô, Trump”. Nelas, usuários faziam troça da possibilidade de uma ligação amigável, após décadas de atritos. Em seguida, quando os iranianos souberam que os Estados Unidos tinham disponibilizado um número de telefone na embaixada suíça para facilitar as comunicações com o Irã, a missão diplomática daquele país europeu recebeu centenas de trotes.

Akbari também citou as piadas do animador Soroush Rezaee, que produziu um curta mostrando Trump acordado por uma ligação às 3 da manhã. “São os iranianos! Finalmente telefonaram!”, diz. Após receber uma série de outros telefonemas — por exemplo, vendedores tentando convencê-lo a comprar tônico capilar — Trump se dá conta de que seu número caiu nas mãos de operadores de telemarketing.

Em seu texto no Al-Monitor Akbari explica o humor iraniano:

Os iranianos lidam com uma série de desafios assustadores. Mas, nestes tempos angustiantes, eles também demonstram ter uma predileção pela elaboração de piadas. O humor é, para os iranianos, uma maneira psicológica de processar as coisas: um mecanismo para dar conta de cenários sombrios. O passado do Irã é repleto de realidades bastantes sombrias, e talvez esse seja o segredo da perseverança da população e de sua confiança no humor.

A análise me fez lembrar do pesquisador iraniano-americano Asef Bayat. Em “Life as Politics” (vida como política), Bayat mostra como as populações no Oriente Médio — sujeitas a regimes repressivos — encontram maneiras cotidianas de resistência. Uma dessas estratégias é justamente o humor. Como se, com o simples fato de rirem, os iranianos pudessem por fim desafiar suas condições extremas de vida.

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